quarta-feira, 7 de novembro de 2018

NA ÍNTEGRA - Catequese do Papa Francisco sobre o sétimo Mandamento

QUARTA-FEIRA, 7 DE NOVEMBRO DE 2018, 14H10

CATEQUESE DO PAPA FRANCISCO
Praça São Pedro – Vaticano
Quarta-feira, 7 de novembro de 2018

Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal (Canção Nova)

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Continuando a explicação do Decálogo, hoje chegamos à sétima Palavra: “Não roubar”.
Escutando este mandamento, pensamos no tema do furto e a respeito da propriedade dos outros. Não existe cultura em que o furto e a prevaricação de bens sejam lícitos; a sensibilidade humana, de fato, é muito suscetível sobre a defesa da posse.
Mas vale a pena abrirmo-nos a uma leitura mais ampla desta Palavra, focalizando o tema da propriedade dos bens à luz da sabedoria cristã.
Na doutrina social da Igreja, fala-se de destinação universal dos bens. O que significa? Escutemos o que diz o Catecismo: “No começo, Deus confiou a terra e seus recursos à administração comum da humanidade para que cuidasse dela, a dominasse por seu trabalho e dela desfrutasse. Os bens da criação são destinados a todo o gênero humano” (n. 2402). E ainda: “A destinação universal dos bens continua primordial, mesmo se a promoção do bem comum exige o respeito pela propriedade privada, pelo respectivo direito e exercício” (n. 2403). [1]
A Providência, porém, não dispôs um mundo “em série”, há diferenças, condições diversas, culturas diversas, assim se pode viver provendo uns aos outros. O mundo é rico de recursos para assegurar a todos os bens primários. Ainda assim muitos vivem em uma escandalosa indigência e os recursos, usados sem critério, vão se deteriorando. Mas o mundo é um só! A humanidade é uma só! [2] A riqueza do mundo hoje está nas mãos da minoria, de poucos, e a pobreza, aliás, a miséria e o sofrimento, de tantos, da maioria.
Se sobre a terra há a fome não é porque falta o alimento! Antes, pelas exigências do mercado se chega às vezes a destrui-lo, se joga. O que falta é uma livre e vislumbrante ação empresarial, que assegure uma adequada produção, e uma empostação solidária, que assegure uma distribuição justa. Diz ainda o Catecismo: “Usando aqueles bens, o homem que possui legitimamente as coisas materiais não as deve ter só como próprias dele, mas também como comuns, no sentido de que elas possam ser úteis não somente a ele, mas também aos outros” (n. 2404). Toda riqueza, para ser boa, deve ter uma dimensão social.
Nesta perspectiva, aparece o significado positivo e amplo do mandamento “não roubar”. “A propriedade de um bem faz de seu detentor um administrador da Providência” (ibid). Ninguém é dono absoluto dos bens: é um administrador dos bens. A posse é uma responsabilidade: “Mas, eu sou rico de tudo…” – esta é uma responsabilidade que você tem. E todo bem subtraído à lógica da Providência de Deus é traído, é traído em seu sentido mais profundo. Aquilo que eu possuo verdadeiramente é aquilo que sei doar. Esta é a medida para avaliar como eu consigo gerir as riquezas, se bem ou mal; esta palavra é importante: aquilo que possuo verdadeiramente é aquilo que sei doar. Se eu sei doar, sou aberto, então sou rico não somente naquilo que eu possuo, mas também na generosidade, generosidade também como um dever de dar a riqueza, para que todos participem. De fato, se não consigo doar algo é porque aquela coisa me possui, tem poder sobre mim e sou escravo. A posse dos bens é uma ocasião para multiplicá-los com criatividade e usá-los com generosidade e, assim, crescer na caridade e na liberdade.
O próprio Cristo, mesmo sendo Deus, “não se prevaleceu de sua igualdade com Deus, mas aniquilou-se a si mesmo” (Fil 2, 6-7) e nos enriqueceu com a sua pobreza (cfr 2 Cor 8,9).
Enquanto a humanidade se aflige para ter mais, Deus a redime fazendo-se pobre: aquele Homem Crucificado pagou por todos um resgate inestimável da parte de Deus Pai, “rico de misericórdia” (Ef 2,4; cfr Gc 5,11). O que nos faz ricos não são os bens, mas o amor. Tantas vezes ouvimos o que o povo de Deus diz: “O diabo entra pelo bolso”. Começa-se com o amor pelo dinheiro, a fome de possuir; depois a vaidade: “Ah, eu sou rico e me orgulho”; e, por fim, o orgulho e a soberba. Este é o modo de agir do diabo em nós. Mas a porta de entrada são os bolsos.
Queridos irmãos e irmãs, ainda uma vez Jesus Cristo nos revela o sentido pleno das Escrituras. “Não roubar” quer dizer: ame com os teus bens, aproveite dos teus meios para amar como pode. Então a sua vida se torna boa e a possa se torna verdadeiramente um dom. Porque a vida não é o tempo para possuir, mas para amar. Obrigada.

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[1] Cfr Encíclica Laudato si’, 67: “Cada comunidade pode tomar da bondade da terra aquilo de que necessita para a sua sobrevivência, mas tem também o dever de a proteger e garantir a continuidade da sua fertilidade para as gerações futuras. Em última análise, «ao Senhor pertence a terra» (Sl 24/23, 1), a Ele pertence «a terra e tudo o que nela existe» (Dt 10, 14). Por isso, Deus proíbe-nos toda a pretensão de posse absoluta: «Nenhuma terra será vendida definitivamente, porque a terra pertence-Me, e vós sois apenas estrangeiros e meus hóspedes» (Lv 25, 23).
[2] Cfr S. Paulo VI, Enc. Populorum progressio, 17: “Mas cada homem é membro da sociedade: pertence à humanidade inteira. Não é apenas tal ou tal homem; são todos os homens, que são chamados a este pleno desenvolvimento. […] Herdeiros das gerações passadas e beneficiários do trabalho dos nossos contemporâneos, temos obrigações para com todos, e não podemos desinteressar-nos dos que virão depois de nós aumentar o círculo da família humana. A solidariedade universal é para nós não só um fato e um beneficio, mas também um dever”.

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