A
doutrina da Imaculada Conceição, cuja memória litúrgica celebra-se neste
segundo domingo do Advento, sempre foi uma realidade muito constante nos
escritos dos santos. Desde os primeiros séculos, a cristandade já recordava a
Virgem Maria como aquela que fora preservada de toda mancha do pecado - a Tota Pulchra, como canta a antífona própria desta festa. Ao
contrário de Eva, a também virgem imaculada que respondeu à visita do anjo
decaído com seu não a Deus, Maria é a virgem imaculada que, recebendo em sua
casa a presença de São Gabriel, respondeu com o seu sim: "Eis aqui a
escrava do Senhor, faça-se em mim segundo a Tua Palavra".
E
foi nesta firme convicção, "depois de na humildade e no jejum, dirigirmos
sem interrupção as Nossas preces particulares, e as públicas da Igreja, a Deus
Pai", que o Papa Pio IX, num dos atos mais solenes de seu pontificado,
declarou "a doutrina que sustenta que a beatíssima Virgem Maria, no
primeiro instante da sua Conceição, por singular graça e privilégio de Deus
onipotente (...) foi preservada imune de toda mancha de pecado
original". Não por acaso, pouco tempo depois desta
proclamação, em 1858, Nossa Senhora apareceria a uma jovem camponesa de
Lourdes, na França, dizendo ser a "Imaculada Conceição".
Antes
da definição de Pio IX, no entanto, existiam algumas controvérsias teológicas
quanto a esse ensinamento. Embora fosse de grande consenso a doutrina segundo a
qual Maria nascera sem pecado algum - estando essa verdade presente não só na
fé popular como também nos textos litúrgicos -, muitos teólogos viam com
dificuldade a proposição, sobretudo porque não conseguiam entender de que modo
isso poderia se relacionar com a redenção operada por Cristo no mistério da
paixão. Afinal, sendo Maria imaculada, teria ela necessitado da salvação?
A
dificuldade, infelizmente, acabou suscitando algumas heresias já na época de
Santo Tomás de Aquino. Para certos teólogos, Maria não teria sido redimida por
Cristo. O imbróglio, com efeito, fez com que o Doutor Angélico reagisse na Suma
Teológica, negando a doutrina da imaculada conceição. Foi somente no final de
sua vida, no seu comentário da saudação angélica (ou seja, da Ave-Maria), que
Santo Tomás voltou atrás e aceitou essa verdade de fé.
A
confusão teológica, contudo, ainda perdurou por algum tempo até que um frade
franciscano, o bem-aventurado Duns Scoto, finalmente apresentasse uma
explicação consistente. Scoto defendia que Maria havia sido salva já no ventre
de Sant’Anna, tendo em vista o sangue de Cristo derramado na cruz. Uma vez que
Deus não está preso ao tempo e ao espaço, Ele bem poderia utilizar os méritos
da Paixão de Jesus antecipadamente, preservando Nossa Senhora das insídias
diabólicas. Foi baseado nesta argumentação que o
também bem-aventurado Papa Pio IX publicou a Bula Innefabillis Deus, pondo
termo à controvérsia e definindo como dogma de fé a "Imaculada Conceição
de Maria".
Na
Bula Innefabillis Deus,
Pio IX usa duas passagens bíblicas para atestar a veracidade do dogma: Gênesis,
capítulo 3 - o chamado Proto-Evangelho em que se narra a "inimizade"
entre a serpente e a Mulher -, e Lucas, capítulo 1, no qual o evangelista
relata a saudação angélica de São Gabriel: "Ave, Cheia de Graça, o Senhor
é convosco". Com esses dois textos, o Papa revela as evidências da
santidade de Maria. Por ter sido agraciada desde o ventre de sua mãe, Maria é a
inimiga por excelência do demônio; e sendo a "Cheia de Graça", à qual
"grandes coisas fez Aquele que é poderoso", possui a mais perfeita
amizade com Deus.
Nós,
brasileiros, temos a grande graça de ter herdado de Portugal a devoção pela
Imaculada Conceição de Maria. Embora muitas pessoas não saibam, é a Imaculada
Conceição a Padroeira de Portugal. Isso porque foram naquelas terras que
aconteceram as maiores batalhas em defesa da fé cristã e, sobretudo, em defesa
da imaculada conceição. Numa época em que a península ibérica via-se ameaçada
pelas investidas dos mouros, os cavaleiros cristãos fizeram um pacto de sangue,
a fim de preservar a fé católica da região. E venceram com a ajuda e
intercessão da Imaculada.
No
Brasil, temos também como padroeira Nossa Senhora da Conceição Aparecida. Ela, como "um exército em ordem de batalha", convida-nos
também a empreender um combate contra a serpente maligna que assalta nossa
dignidade, nossos filhos e nossa fé.
Rezemos
a Ela, a Auxilium Christianorum, para que neste momento, em que duas leis
perniciosas tramitam em nosso parlamento com o intuito de destruir a família
brasileira, a cabeça da serpente seja esmagada e precipitada ao inferno junto
com seus demônios.
Nossa Senhora da Conceição Aparecida, rogai por nós!
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