
É bem conhecido o argumento dos
tradicionalistas anti-Vaticano II, segundo o qual, por não ter condenado os
erros do mundo moderno, o Concílio Vaticano II automaticamente assimilou-os.
Assim, o Concílio Vaticano II seria um
Concílio maçônico por não ter condenado a Maçonaria...
Seria modernista por não ter condenado
a heresia do Modernismo... Seria marxista por não ter condenado o marxismo... Seria
protestante por não ter condenado o Protestantismo... Seria alguma coisa por
não ter condenado alguma coisa...
Este argumento de causa e efeito vale
para qualquer uma das acusações sobre supostos erros e heresias que os
tradicionalistas anti-Vaticano II tenham a disferir contra este Concílio
Ecumênico. Dizem eles que ao recusar-se a se pronunciar dogmaticamente, e ao
querer manter num nível “meramente pastoral” (como não cansam de repetir), o
Concílio Ecumênico Vaticano II teria perdido sua autoridade, teria se condenado
e condenado a Igreja a uma autodemolição, teria fundado uma anti-Igreja, feito
surgir uma “Roma neo-modernista e neo-protestante”... e blá-blá-blá.
Vale salientar, contudo, que a
condenação aos erros modernos, que os falsos tradicionalistas tanto cobram do
Concílio Vaticano II, já fora inúmeras e repetidas vezes proferida pela Igreja
antes do Concílio, e continuou a sê-lo após o Concílio. A igreja já condenara a
Maçonaria, já condenara o Protestantismo (e há muito tempo!), já condenara o
Modernismo, já condenara o Marxismo... Todas estas condenações já haviam sido
proferidas.
Ao invés de repetir anátemas que já
haviam sido proferidos contra os erros e heresias modernas, a Igreja achou
melhor fazer refulgir as luzes da Fé Católica, confrontando-as com os erros
modernos. Como sabiamente disse o Papa Beato João XXIII, no Discurso de Solene
Abertura do Concílio Vaticano II, a 11 de Outubro de 1962, explicando que o
combate aos erros neste momento se daria pela demonstração íntegra da Verdade:
“Ao suceder uma época a outra, vemos que as opiniões dos homens se sucedem
excluindo-se umas às outras e que muitas vezes os erros se dissipam logo ao
nascer, como a névoa ao despontar o sol. A Igreja sempre se opôs a estes erros;
muitas vezes até os condenou com a maior severidade. Agora, porém, a esposa de
Cristo prefere usar mais o remédio da misericórdia do que o da severidade.
Julga satisfazer melhor às necessidades de hoje mostrando a validez da sua
doutrina do que renovando condenações. Não quer dizer que faltem doutrinas
enganadoras, opiniões e conceitos perigosos, contra os quais nos devemos
premunir e que temos de dissipar; mas estes estão tão evidentemente em
contraste com a reta norma da honestidade, e deram já frutos tão perniciosos,
que hoje os homens parecem inclinados a condená-los, em particular os costumes
que desprezam a Deus e a sua lei...” (SS. PAPA BEATO JOÃO XXIII, Discurso de Abertura do Concílio Vaticano II).
A Igreja, portanto, aponta agora a
Verdade, o caminho correto a ser seguido pelo mundo moderno, já que os erros e
as vias tortuosas já haviam sido indicados por Pio IX no seu corajoso Syllabus,
por Leão XIII na sua magistral Humanum Genus, por S. Pio X na sua magnífica
Pascendi Dominici Gregis, etc.
Isto explicou o Papa Paulo VI há 44
anos, em Alocução aos sacerdotes participantes da XIII Semana Italiana de
Atualização Pastoral, a 6 de setembro de 1963. As palavras de Paulo VI são
deveras esclarecedoras, e fulminantes (um verdadeiro torpedo) para o argumento
dos tradicionalistas anti-Vaticano II:
“Não se creia também que
esta solicitude pastoral, assumida hoje pela Igreja como
programa primordial que absorve sua atenção e polariza seus cuidados, signifique
uma modificação do julgamento formulado acerca dos erros disseminados em nossa
sociedade, e já condenados pela Igreja, como o marxismo ateu, por
exemplo. Procurar aplicar remédios salutares e urgentes a uma doença contagiosa
e mortal não quer dizer mudar de opinião a respeito dessa doença,
mas, pelo contrário, significa procurar cambatê-la não somente em teoria, mas
praticamente; significa que se quer, depois do diagnóstico, aplicar uma
terapêutica, isto é, após a condenação doutrinária, aplicar a
caridade salutar” (SS. PAPA PAULO VI, Alocução a 6 de setembro de
1963) (grifos nossos).
Que palavras claras e esclarecedoras!
Que golpe duro no argumento errôneo e
absurdo dos tradicionalistas anti-Vaticano II!
O Papa deixou mais do que claro que
“esta solicitude pastoral, assumida hoje pela Igreja [...] [não
significa] uma modificação do julgamento formulado acerca dos erros
disseminados em nossa sociedade, e já condenados pela Igreja”. Que clareza! Combater o erro mostrando a Verdade não é
modificar a opinião de que aquele erro é um erro! Não condenar novamente os
erros que “já [foram] condenados pela Igreja”, mas optar por combatê-los
mostrando a beleza da Fé Católica, não significa assimilá-los, como absurdamente
concluem os falsos tradicionalistas, pois “procurar aplicar remédios salutares
e urgentes a uma doença contagiosa e mortal não quer dizer
mudar de opinião a respeito dessa doença”! Que esclarecedor foi o Papa
Paulo VI!
Para aqueles que negam a autoridade
de Paulo VI (sedevacantistas) ou que embora a reconheçam dizem que seu
Magistério nada vale, pois o acusam de ter sido um Papa liberal, eis o que
disse sobre ele Irmã Lúcia, uma dos pastorinhos de Fátima, ela que viu, ouviu e
falou com Nossa Senhora:
"Não há outro que seja
verdadeiro, nem escolhido por Deus para cabeça do Seu Corpo Místico sobre a
terra. Ele é o guia do Seu povo. Povo de Deus, o que constitui
a Igreja militante, da qual nós temos a felicidade de ser membros; precisamos
manter-nos fiéis, firmes na Fé, na Esperança e na Caridade, unidos ao
representante de Cristo na Terra, seguindo a Sua doutrina, os Seus ensinamentos,
as Suas directrizes: - se alguém lhe disser o contrário, não lhe
dê crédito, porque esses tais estão em erro; são os de quem fala Nosso
Senhor no Seu Evangelho: ‘As varas que, separadas da cepa, murcham, secam e só
servem para ser lançadas ao fogo e arder’. Permaneçamos unidos à videira, para
que a seiva Divina corra nas nossas almas e nos salve...” (O Segredo de Fátima. Irmã Lúcia; Edições Loyola,
São Paulo, 1991. Pág. 189) (grifos nossos).
Onde está agora a coerência dos
tradiconalistas anti-Vaticano II, onde estão corretos, quando o próprio
Sucessor de Pedro os refuta de forma tão clara e certa?
Com estas palavras, o grande Sumo
Pontífice Paulo VI, em tom moderado mas em linguagem firme, deu um duro golpe
no tradicionalismo anti-Vaticano II, deixando em cacos um dos pilares mais
fortes de sua argumentação.
Criado em Segunda, 22 Outubro 2007 00:00
Escrito por Taiguara Fernandes de Sousa
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